O lúpus eritematoso sistêmico faz parte de um grupo de doenças conhecidas como doenças autoimunes, o que significa que o sistema imunológico ataca os tecidos saudáveis do corpo por engano. O tipo mais comum é o lúpus eritematoso sistêmico (LES), que pode afetar múltiplos órgãos, incluindo pele, articulações, rins, coração, pulmões, cérebro e células sanguíneas. Nem todas as pessoas com lúpus terão os mesmo órgãos acometidos.
O lúpus pode ser classificado como:
O lúpus é mais comum em mulheres, representando cerca de 90% dos casos. Embora possa acontecer em qualquer idade, incluindo crianças e idosos, é mais frequente entre 15 e 45 anos. Pessoas de etnias afro-americana, latina e asiática têm maior risco de desenvolver a doença, e os sintomas tendem a ser mais graves nesses grupos. No Brasil, estima-se incidência de 8,7/100.000/ habitantes/ano, com estimativa de cerca de 150.000 a 300.000 pessoas vivendo com lúpus no país.
As causas exatas do lúpus não são conhecidas, mas acredita-se que seja uma combinação de fatores genéticos, hormonais e ambientais, como a exposição ao sol e infecções que, associados a alterações no sistema imune, levarão ao desenvolvimento da doença. Dessa forma, fica claro que o lúpus não é uma doença contagiosa, sendo causada por alterações no funcionamento do sistema imune. Em pessoas sadias, o sistema imune produz proteínas (anticorpos) contra proteínas estranhas, como as proteínas de vírus e bactérias. Porém, em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico, o sistema imune produz anticorpos contra as proteínas ou células do próprio corpo, sendo, por este motivo, chamados de autoanticorpos (anticorpos contra o que é próprio). Os autoanticorpos iniciam um processo que pode causar inflamação em diferentes órgãos, como nas articulações, pele, rins, artérias, sistema nervoso e nas células do sangue.
Os sintomas do lúpus podem variar de pessoa para pessoa e podem ir e vir, alternando períodos que chamamos de atividade de doença (paciente com queixas e/ou alterações laboratoriais) e períodos de remissão ou de doença inativa (paciente sem queixas e exames sem alterações). Os principais sintomas incluem:
O diagnóstico do lúpus pode ser desafiador uma vez que os sintomas variam e podem simular outras doenças. Por isso, o diagnóstico do lúpus eritematoso sistêmico é feito por meio de uma boa conversa com o seu médico, da avaliação das manifestações clínicas e de exames complementares, incluindo exames de sangue (hemograma, exames para avaliação do processo inflamatório, função renal, pesquisa de autoanticorpos, etc) e urina. Por ser uma doença autoimune, o médico pode solicitar alguns exames e pesquisa de autoanticorpos específicos que podem estar presentes na pessoa com lúpus. Algumas vezes, exames de imagem e biópsia de tecidos (rim e pele, por exemplo) são necessários.
Ter um exame de FAN (Fator Antinuclear) positivo não significa necessariamente que você tem lúpus. O FAN é um exame de sangue que detecta a presença de anticorpos que atacam as células do próprio corpo. Este exame é positivo em 98 a 99% das pessoas com lúpus em atividade, mas também está presente em outras doenças autoimunes e até mesmo em 12 a 22% da população sadia, ou seja, sem nenhuma doença imunomediada associada. Desta forma, o FAN positivo não é específico para o lúpus e pode ocorrer em várias outras condições ou até mesmo em pessoas saudáveis. O resultado do FAN deve sempre ser avaliado em conjunto com outros critérios clínicos e laboratoriais. Em caso de exame positivo, consulte um reumatologista para melhor avaliação e esclarecimento.
O tratamento envolve a prática de exercício físico, uso de fatores de proteção solar, hidroxicloroquina e imunossupressores de acordo com a manifestação da doença. Além disso, é importante uma dieta equilibrada e manter hábitos de vida saudáveis, como evitar o tabagismo. Estas medidas ajudam no controle do funcionamento do sistema imune e dos sintomas e a prevenir recidivas da doença. Além disso, o acompanhamento durante o período de tratamento é essencial. Devem ser evitadas a automedicação e as alterações no tratamento (aumento ou redução das doses dos medicamentos, inclusão ou suspensão dos mesmos) que não sejam orientadas pelo seu médico.
Pessoas com lúpus são frequentemente sensíveis à luz solar (fotossensibilidade). A exposição ao sol pode desencadear ou piorar os sintomas, causando erupções cutâneas e exacerbação da inflamação em outros órgãos e sistemas. O uso de Fator de Proteção Solar (FPS) ajuda a proteger a pele dos raios ultravioleta (UV), prevenindo atividade da doença, recidivas e danos à pele. Dessa forma, use protetor solar de amplo espectro (FPS 30 ou superior) diariamente, mesmo em dias nublados, dentro ou fora de casa, aplicando-o 15 minutos antes da exposição e reaplicando-o a cada 2-3h se fora de casa. Além disso, evite exposição solar prolongada em horários de maior incidência solar entre 10:00 e 16:00 horas (ou 9:00 e 15:00 horas se estiver no nordeste do Brasil) e vista roupas de proteção, como chapéus de abas largas e roupas de mangas compridas.
O uso dos antimaláricos (cloroquina ou hidroxicloroquina) está indicado tanto para as formas mais leves quanto nas mais graves e deve ser utilizado e mantido mesmo que a doença esteja sob controle (remissão), a não ser que o paciente apresente alguma contraindicação ao seu uso, pois auxilia na manutenção do controle do lúpus. Além disto, seu uso a longo prazo associa-se a menor ocorrência de danos ou sequelas (lesões permanentes), diminuição do risco de tromboses, melhora da glicemia (açúcar no sangue) e do perfil do colesterol, diminuição do risco de complicações durante a gravidez e diminuição do risco de morte pelo lúpus. São medicamentos seguros e amplamente usados no tratamento do lúpus há mais de 30 anos. O aspecto mais importante em seu uso é a avaliação periódica com o médico oftalmologista. É um efeito colateral raro com o uso da medicação, mas, em alguns casos pode ocorrer alteração na mácula (estrutura ocular que ajuda na visão). Por isso, é importante um acompanhamento oftalmológico periódico conforme a orientação do seu médico.
Os imunossupressores são os medicamento que agem na modulação do sistema imunológico no lúpus. São classificados em imunossupressores sintéticos (azatioprina, ciclofosfamida, micofenolato de sódio ou mofetil, leflunomida, ciclosporina, metotrexate) e biológicos (belimumabe, anifrolumabe e rituximabe) e outros (talidomida, dapsona, etc). A escolha do imunossupressor e o tempo de tratamento são feitos de acordo com as manifestações clínicas, laboratoriais e gravidade da doença. Os pacientes em uso de tratamento imunossupressor necessitam de acompanhamento regular e periódico e devem ter atenção especial quanto ao maior risco de infecções, já que podem diminuir a capacidade do indivíduo de defender-se contra alguns microrganismos (vírus, bactérias e fungos).
Sim, as mulheres com lúpus podem engravidar. No entanto, é importante que a gravidez seja planejada entre a família e o médico para que se tenha menos riscos de complicações durante a gestação tanto para a mãe como para o bebê. É ideal que o lúpus esteja em remissão ou bem controlado por pelo menos seis meses antes da concepção. A gravidez em mulheres com lúpus é considerada de alto risco, exigindo acompanhamento rigoroso por um obstetra especializado e um reumatologista. Alguns medicamentos usados para o controle do lúpus devem ser adaptados ou mesmo interrompidos antes ou durante a gestação, mas sempre com o acompanhamento médico adequado para evitar atividade ou recidiva da doença. É importante ressaltar que o uso da hidroxicloroquina é indicado tanto na gestação como na amamentação da pessoa com lúpus, diminuindo o risco de complicações tanto para a mãe como para o bebê.
Sim, mulheres com lúpus podem usar anticoncepcionais e terem uma gestação planejada. No entanto, a escolha do método contraceptivo deve ser personalizada e discutida com o seu médico reumatologista e ginecologista. A escolha entre anticoncepcionais injetáveis, orais, implantes hormonais e dispositivos intrauterinos (DIU) pode varias de acordo com as suas preferências, manifestações clínicas, perfil de anticorpos antifosfolípides e comorbidades. Converse com o seu médico, tenha uma vida sexual saudável e planeje a sua gestação para o momento adequado.
Pessoas com lúpus têm um sistema imunológico comprometido, o que as torna mais susceptíveis a algumas infecções. Vacinas ajudam a prevenir doenças que podem ser particularmente graves ou causar complicações adicionais em pessoas com lúpus. As vacinas de micro-organismos inativados podem ser realizadas mesmo em uso de imunossupressores, embora a resposta para algumas vacinas possa ser diminuída. No entanto, pessoas com lúpus em uso de determinadas doses de corticoide e/ou imunossupressores não devem tomar vacinas contendo vírus vivos ou atenuados como as vacinas contra febre amarela, sarampo/caxumba/rubéola (tríplice viral), varicela e poliomielite oral (Sabin), por isso é importante consultar o médico.
Entende-se como atividade física qualquer movimento corporal que leve a gasto energético acima dos níveis de energia em repouso. A quantidade de energia utilizada para realizar um determinado movimento traduz o nível de prática da atividade física que é exigido pelo movimento. Exercício físico, por sua vez, consiste em uma atividade física planejada, repetitiva e estruturada com objetivo bem definido. O exercício físico pode ter diferentes efeitos locais e sistêmicos dependendo da forma como é realizado. Exercício físico agudo tem efeito pró-inflamatório enquanto exercício físico crônico tem efeito anti-inflamatório. A modalidade, intensidade, frequência e duração do exercício também podem proporcionar respostas distintas do sistema imune, eixo neuroendócrino e cardiovascular. Desta forma, para se obter os benefícios do exercício físico de forma segura e eficaz, é necessário que o indivíduo tenha uma prescrição planejada e individualizada, com o objetivo predefinido, a fim de que a escolha da modalidade, intensidade, frequência e duração do exercício físico sejam bem estabelecidos. Pode ter como objetivos aumento da força muscular, incremento da resistência muscular ou mesmo melhora da capacidade cardiovascular. Para prescrição do exercício devem ser levados em consideração o objetivo, a capacidade funcional inicial do paciente, história clínica e doenças associadas, levando-se em consideração ainda possíveis restrições ou incapacidades. Além disso, há de se considerar as preferências individuais em relação às atividades propostas, pois o exercício físico precisa ser prazeroso ao paciente tanto durante quanto após a execução. A Sociedade Americana de Cardiologia sugere que se faça pelo menos 150 minutos por semana de exercício moderado ou 75 minutos por semana de exercícios vigorosos, podendo haver uma combinação de atividade física moderada e intensa (American Heart Association, 2013). A Sociedade Americana de Medicina do Esporte recomenda de 30 a 60 minutos de exercício com intensidade moderada, cinco dias por semana ou 20 a 60 minutos de exercício vigoroso, três vezes por semana (American College of Sports Medicine, 2011).
É recomendável que o paciente sempre converse com seu médico antes de iniciar a prática de exercício físico tanto para orientações gerais quanto em relação à doença que o paciente apresenta. Os principais cuidados são:
. Este é capaz de realizar um bom exame clínico e, através de uma boa conversa, detectar alterações pulmonares, cardiovasculares ou no aparelho locomotor. Relate principalmente queixas e sintomas que surgem quando realiza atividades (como dor no peito, falta de ar, palpitações e desmaios), assim como também doenças prévias e antecedentes familiares de doença cardíaca.
Nem todos são obrigatórios, devendo ser indicados individualmente a critério do médico. Dentre os exames que podem ser solicitados podemos citar:
– Hemograma: avaliar presença de anemia ou alteração em outras linhagens celulares;
– Velocidade de hemossedimentação (VHS), anti-dsDNA e dosagem complemento: avaliar possível atividade da doença em algumas doenças reumáticas autoimunes;
– Glicemia jejum: avaliar diagnóstico de diabetes ou intolerância à glicose;
– Colesterol total e frações e triglicerídeos: diagnóstico de dislipidemia (alteração nos níveis de colesterol e triglicérides);
– Creatinina: avaliação da função dos rins;
– Urina I: avaliar possível acometimento dos rins em algumas doenças reumáticas autoimunes;
– Eletrocardiograma e Teste ergométrico: avaliação de arritmias ou doença isquêmica do coração em repouso e durante o esforço físico;
– Teste Ergoespirométrico (ou Teste Cardiopulmonar): teste utilizado para avaliação cardiorrespiratória em que se analisam os gases expirados e a função cardíaca. É útil também para prescrição do treinamento.
principalmente entre 9h e 15h, quando há maior intensidade de radiação ultravioleta, pois ela pode desencadear atividade da doença. O uso do protetor solar é obrigatório, assim como também uso de chapéu, bonés ou sombrinhas. Lembrar que o protetor solar deve ser repassado, pois seu efeito não dura mais que 3 horas.
use roupas leves, claras e ventiladas; não faça exercícios em jejum e evite comer demais antes da atividade física; use tênis confortáveis e macios.
devem comunicar ao médico e ao educador físico, pois podem apresentar maior risco de sangramento, devendo evitar atividades com maior risco de ferimentos e traumas.
O médico e o educador físico podem e devem conversar sempre que possível, pois em decisão compartilhada com o paciente, podem ainda indicar qual a melhor modalidade (natação, hidroginástica, corrida, caminhada, dança, musculação, etc), intensidade (leve, moderada ou intensa), frequência (quantas vezes por semana) e duração (tempo) do exercício a ser realizado pelo paciente. Não podemos esquecer que em algumas situações específicas a prática de exercício físico está contraindicada.
Assim, é sempre importante conversar com seu médico antes de iniciar a sua prática, levando a prática de exercício físico regular a se tornar um grande aliado no tratamento das doenças reumáticas.